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O Oboé e a Voz Humanapublicado em quinta-feira, 8 de janeiro de 2015( 1 comentário , enviar um comentário! )
Vídeos ilustrativos com peças da música clássica no final do texto.
Cantar é a forma mais simples de expressar uma canção, muitos cantam mesmo sem conhecer os detalhes da arte.
É também a maneira mais singela de se fazer música. Se considerar a arte do canto, ver-se-á que é algo bem mais complexo do que apenas cantarolar palavras lembrando uma melodia. A voz humana é o mais antigo e original instrumento musical, ela já nasce com o ser humano, “já vem de fábrica”, necessita apenas ser aprimorada. A música vocal é tão antiga quanto a espécie humana, na Biblia há relatos de que havia um coral para o acompanhamento do canto nos cultos. Alguns salmos eram na verdade canções compostas para determinada liturgia no templo.
Com o florescimento do Cristianismo na Europa, houve um certo desenvolvimento da arte do canto nos templos europeus de forma que esta arte evoluiu muito mais do que a música instrumental. Pode-se considerar que o desenvolvimento da música instrumental veio em função da música coral, visando melhorar a arte de acompanhamento vocal, pesquisando instrumentos cujo timbre mais se aproximasse à voz humana. No princípio, grupos de vozes cantavam em uníssono, ou seja, todos cantavam a mesma melodia, foi na Idade Média que começaram a florescer os corais e menestréis que se apresentavam em público cantando em vozes divididas, geralmente acompanhada de instrumentos rústicos como rabecas, crumhorns, a flauta doce já atuava nestes grupos e pode-se considerar que já era um instrumento evoluído.
Pesquisas apontam que já no século XVI havia músicos que queriam melhoramentos na arte de fabricação de instrumentos musicais para que pudessem enriquecer a arte da música coral. Cita-se aqui o desenvolvimento da arte da luthieria em Cremona quando os mestres italianos aprimoraram a rabeca e dela nasceu o violino. Pouco tempo mais tarde cerca de 80 anos veio o desenvolvimento do oboé, do fagote e da flauta transversal, a flauta doce já era um instrumento de acompanhamento coral desde a Idade Média.
Com a evolução das técnicas do violino, muitos músicos violinistas, tornaram-se professores na arte da execução do instrumento, da mesma forma outros instrumentos como o oboé e o fagote, exigiam alguém com mais conhecimento técnico para o ensino. Leopold Mozart (1719-1787) enquanto ensinava violino, exigia que seus alunos produzissem o som do instrumento como se estivessem “cantando”, leve e com um som mais uniforme. Da mesma forma Henri Brod (1799-1839), deixou escrito em seu Método para Oboé de 1826 que os estudantes de oboé, sustentassem a nota da mesma forma que os cantores sustentam.
Johann Philipp Eisel (1738-1796) comentou: “ O oboé entre todos os instrumentos musicais, é o instrumento cujo timbre mais se aproxima da voz humana”. Heinz Holliger (1939) eminente oboísta na segunda metade do século XX sustenta a mesma tese em sua entrevista a Rudolf Luck em 1970.
Observando na forma das cordas vocais, vê-se que lembra o conjunto de palheta dupla do oboé. Se considerar a forma como o som é produzido pelas cordas vocais, pela passagem da respiração ela expande ou comprime para emitir o som desejado, da mesma forma para produzir o som do oboé, vibra-se a palheta pela passagem do ar. Se considerar que no oboé o músico tem total controle da sonoridade pela embocadura e assim como nos instrumentos da mesma família e no fagote, a palheta seria algo como a extensão de suas cordas vocais. Em instrumentos de palheta dupla como o oboé e o fagote, o músico tem um contato mais íntimo com o instrumento, ele vibra duas membranas iguais, produzindo através delas um som mais harmônico e preciso, sem necessidade de boquilha, desta forma ele consegue total controle sobre o conjunto vibratório, os elementos que vibram são da mesma característica física, sem diferença de material que existe entre a palheta única e a boquilha do clarinete. Quando um cantor excuta uma ária, as cordas vocais são apenas parte do conjunto vibratório, os músculos da face formam um sistema acústico que vai determinar o som final, da mesma forma que quando vibra-se a palheta dupla junto ao instrumento, forma-se um conjunto acústico que determinará o som que será emitido. Assim como a qualidade da voz depende da elasticidade, técnica e caraterística humana do cantor, no oboé a qualidade é influenciada pela característica física do corpo do instrumento e da qualidade da cana bem como a forma que é raspada a palheta. O corpo do instrumento também determina o volume de som emitido. Instrumentos mais antigos com menos madeira e uma furação diferenciada dos atuais produziam um som mais tímido. Devido o aumento do tamanho das salas de concerto, oboés atuais possuem mais madeira em seu corpo, proporcionando maior volume sonoro.
Cordas vocais do ser humano Outra característica a ser citada que torna ambos semelhantes é quanto ao volume de som que podem produzir, na voz humana, a potência sonora depende da quantidade de ar aplicada pelo executante para obter mais intensidade sonora, assim no oboé para obter um som mais forte, o músico aplica maior intensidade de ar na coluna sonora, diminuindo a intensidade quando pretende tocar mais piano.
Conjunto palheta do oboé tubo metálico envolvido com cortiça cana enrolada e raspada Cientes desta propriedade, compositores do período barroco como Bach e seus contemporâneos utilizavam largamente o oboé para acompanhamento de suas árias de voz. Mais tarde no classicismo Haydn, Mozart e outros compositores utilizaram a mesma forma de compor.
Abertura da palheta do oboé Belas passagens musicais que ilustram essa característica podem ser constatadas em algumas composições que ficaram famosas: a terceira ária da Cantata BWV202 de Bach, mais conhecida como Cantata do Casamento, a soprano canta somente com o acompanhamento do oboé e do baixo contínuo, em algumas execuções, acrescenta o fagote, dando à peça um colorido especial e na peça Zaide de Mozart na ária ruhe sanft, o acompanhamento é orquestral, porém o oboé e o fagote são instrumentos protagonistas. (Vide vídeo anexo).
No primeiro artigo deste blog: Porque Oboé na História? Música Executada com Instrumentos Originais, coloquei como vídeo ilustrativo uma ária do Glória de Vivaldi RV580, a ária Domine Deus com oboé barroco, soprano e baixo contínuo (cello e teorba), retirado do filme sobre a vida de Vivaldi como diretor musical do Ospedalle de la Pietá em Veneza, mais um vídeo que ilustra que o timbre do oboé é o que mais se assemelha à voz humana, vale a pena conferir lá. Embocadura do oboé Vídeos anexos: Bach: Cantata BWV202, gravação com oboé barroco acompanhando a soprano e uma orquestra barroca, pena que faltou o fagote no baixo contínuo. Mozart: Zaide Ária Ruhe Sanft, com a Sinfonietta Pannonica Chamber Orchestra, tendo como soprano solista: Viktória Varga e condução de Péter Szabó, executada com instrumentos modernos, mostra a semelhança da voz humana com o timbre do oboé, aqui nesta peça um trílogo de soprnao, oboé e fagote fazem o maravilhoso colorido da peça. Bach: Cantata BWV202, gravação de estúdio com instrumentos modernos e fagote no baixo contínuo. Vídeos relacionados:Comentários:Envie o seu comentário:Quer comentar no Facebook? Então clique aqui.Comente no Facebook: |